Em um mundo cada vez mais interconectado, onde fronteiras parecem se diluir diante do fluxo de informações, capitais e pessoas, a noção tradicional de soberania nacional, o poder supremo e independente de um Estado sobre seu território e população é colocada à prova. A pergunta que ecoa nos corredores da diplomacia e nas discussões acadêmicas é: a soberania de um país, nos dias de hoje, é plena ou relativa?
Historicamente, a soberania foi concebida como um atributo absoluto. Trata-se do direito inalienável de um Estado de se autogovernar, de legislar e de executar suas leis sem interferência externa. A Paz de Vestfália, em 1648, é frequentemente citada como o marco que consolidou esse princípio, estabelecendo a igualdade jurídica entre os Estados e o respeito à sua integridade territorial. Sob essa ótica, um Estado soberano tem o poder de decidir seus próprios assuntos internos e externos, de firmar alianças e de traçar seu próprio destino.
No entanto, a realidade do século XXI apresenta um cenário complexo. A globalização, em suas diversas facetas, impõe limitações e influências que relativizam a autonomia total dos Estados. A ascensão de organizações internacionais, como a Organização das Nações Unidas (ONU), a União Europeia (UE) e a Organização Mundial do Comércio (OMC), cria um arcabouço de regras e normas que os Estados soberanos, ao aderirem, aceitam voluntariamente. Essas adesões implicam em ceder parte de sua autonomia em troca de benefícios mútuos, cooperação em áreas críticas e maior estabilidade.
Questões como o combate ao terrorismo, a proteção do meio ambiente, a regulação financeira e a saúde pública transcendem as fronteiras nacionais. Nenhum país, por mais poderoso que seja, pode resolver sozinho esses desafios globais. A necessidade de cooperação internacional e a interdependência econômica e social tornam a soberania plena uma utopia. Acordos internacionais sobre direitos humanos, por exemplo, estabelecem padrões que os Estados se comprometem a seguir, podendo, em casos extremos, justificar intervenções externas sob o princípio da “Responsabilidade de Proteger” (RP), embora este seja um tema controverso.
A economia globalizada também exerce uma influência significativa. Fluxos de investimento estrangeiro, políticas monetárias de grandes potências e a volatilidade dos mercados financeiros internacionais podem impactar diretamente a economia de um país, limitando sua margem de manobra em políticas econômicas internas. A dependência de cadeias de suprimentos globais ou de tecnologias específicas também pode criar vulnerabilidades e influenciar decisões soberanas.
Por outro lado, a ideia de soberania não desapareceu. Ela continua sendo um princípio fundamental do direito internacional e um ideal para a maioria das nações. O que observamos é uma transformação: a soberania se torna um conceito mais dinâmico e relacional. Em vez de um poder absoluto e isolado, a soberania é exercida dentro de um contexto de interações e obrigações mútuas. Os Estados ainda detêm o direito de tomar suas decisões, mas essas decisões são cada vez mais moldadas por acordos, normas internacionais e pela necessidade de cooperação.
Em suma, a soberania nacional nos dias de hoje é, em grande medida, relativa. Os Estados soberanos continuam a ser os atores primários no cenário internacional, mas operam em um ambiente onde a interdependência e a cooperação são essenciais para enfrentar os desafios complexos do século XXI. A capacidade de um país de agir de forma autônoma é, portanto, condicionada pelas suas relações com outros Estados e organizações internacionais, configurando uma soberania que é mais negociada e compartilhada do que absoluta e inquestionável. A arte da política externa moderna reside, em grande parte, em equilibrar a defesa dos interesses nacionais com a participação construtiva na governança global.