A partir de 1922, o dia internacional da mulher é celebrado oficialmente no dia 08 de março, porque se tornou o marco das lutas pelos direitos sociais, políticos e individuais das mulheres, que desde os meados do século dezenove vinham lutando por melhores condições de trabalho, pelo voto feminino, entre outras reivindicações.
É um marco para relembrar as costureiras de Nova York, que estavam em greve por melhores condições de trabalho e em homenagem, também, às mulheres russas, as quais lutavam por paz, pão e terra, sendo que foram protagonistas da Revolução de 1917.
O incêndio referido ao Dia Internacional da Mulher, na realidade ocorreu no dia 25 de Março de 1911 na cidade de Nova York, Estados Unidos, numa confecção em que empregava 600 trabalhadores, a maioria mulheres imigrantes: judias e italianas, com idade entre 13 e 23 anos. Essas trabalhadoras laboravam em torno de dezesseis horas por dia em ambiente bastante precário (com assoalho coberto de materiais inflamáveis: retalhos de tecidos e lixo amontoado por toda parte). Os patrões para impedir a interrupção do trabalho, trancavam a porta de saída com chaves, que levavam nos bolsos, isso num prédio de dez andares, sem escadas de incêndio, nem mangueiras de água. Assim quando estalou o incêndio nos três últimos andares, a tragédia estava anunciada! Com a fumaça e o fogo se expandindo em grande escala, face à grande quantidade de material inflamável, as operárias desesperadas pularam das janelas para a morte; muitas mulheres morreram sentadas em frente às próprias máquinas de costuras. Quando os bombeiros nova iorquinos conseguiram chegar onde estavam as operárias, cento e quarenta e sete já tinham morrido, carbonizadas ou estateladas na calçada da rua, para onde se jogaram em desespero. No funeral coletivo compareceram cerca de cem mil pessoas para lamentar a perda de vidas tão jovens e declarar solidariedade a todas as mulheres trabalhadoras.
Após essa tragédia, o governo norte americano nomeou a Comissão Investigadora de Fábricas de Nova York, coisa que já tinha sido solicitada pelos sindicados há mais de cinquenta anos, só aí iniciando as legislações de proteção à saúde e à vida das trabalhadoras, que vieram beneficiar as operárias de todos os Países, inclusive o Brasil, com limite de horário de trabalho, licença maternidade, entre outros benefícios.
No local do incêndio está construída hoje a Universidade de Nova York, onde consta a inscrição:- “neste lugar, em 25 de março de 1911, 147 trabalhadoras perderam suas vidas na Companhia de Blusas Triângulo, deste martírio resultaram novos conceitos de responsabilidade social e legislação do trabalho, que ajudaram a tornar as condições de trabalho dos Estados Unidos as melhores do mundo”.
No Brasil, quando o colonizador europeu chegou, passou a escravizar o índio e a tratar a mulher índia como se fosse propriedade (para o trabalho e para o âmbito sexual) e, com a vinda dos negros trazidos da África para trabalhar nas fazendas de cana de açúcar, os senhores de engenho passaram a estuprar as negras da senzala, criando-se, desde o início, uma permissividade para violência e o tratamento desigual das mulheres, que até os dias de hoje, ainda se encontra presente na nossa cultura, relegando às mulheres o papel de cidadãs de segunda categoria, dificultando a fruição de seus direitos.
Durante um bom tempo, as mulheres ficaram restritas ao lar, onde muitas delas sequer eram alfabetizadas, pois não se achava necessário, pois o homem era a cabeça do casal, o chamado “pátrio-poder” que vigorou no Código Civil de 1916 até o novo código de 2003.
O advento do Estatuto da Mulher Casada de 1962 trouxe luz à situação tenebrosa feminina, pois deixou de reduzir a mulher casada à condição de relativamente incapaz, possibilitando que a mulher pudesse exercer atividades da vida civil como: trabalhar fora e ter acesso ao seu salário; comprar e vender imóveis e móveis, votar e ser votada, mantendo ao mesmo tempo, sua responsabilidade tradicional no seio da família, como esposa e mãe.
Assim, a queda das velhas tradições patriarcais, ensejando a evolução do modelo familiar e em especial do papel da mulher dentro do lar e na sociedade não veio gratuitamente, pelo contrário, curvaram-se diante da vertiginosa mudança nos comportamentos sociais e nos compromissos assumidos pelo País em Convenções Internacionais no decorrer do século vinte, em especial os eventos comemorados no Dia Internacional da Mulher.
Neste esteio, referendando os princípios constitucionais da igualdade de direitos e deveres entre homem e mulher no âmbito social e familiar, veio a Lei “Maria da Penha”, inibidora da violência doméstica contra a mulher. Pois os organismos públicos constataram que a violência contra a mulher se tornou uma questão de saúde pública, porque a cada quatro mulheres que faltam ao serviço, uma delas o faz por ter sido vítima de violência doméstica; sendo as mulheres as que mais se socorrem do serviço público, gerando uma grande demanda a um setor sobrecarregado, isso sem falar no Judiciário, aonde vão à procura de proteção contra seus algozes.
Não temos muita coisa a comemorar, pois a violência contra a mulher parece aumentar a cada ano, como é crescente o número de mulheres sozinhas que dirigem e sustentam famílias após a morte ou, na maioria das vezes, do abandono de maridos e companheiros. Assumem, assim, sozinhas a manutenção de lar e filhos.
As consequências deste quadro de desigualdade afetam não só as mulheres vítimas diretas, mas toda a sociedade, gerando o empobrecimento das mulheres vítimas de violência, com a consequente exclusão social.
Assim a luta pelos direitos das Mulheres não pode esmorecer, ou achar que chegamos ao seu ápice, mas devemos manter a chama acesa da busca pela igualdade de tratamento, tanto social, como profissional e aspirar ao exercício de cidadania, que são os primeiros passos para a transformação de uma cultura de violência para a de solidariedade, com a consequente formação de uma sociedade mais justa e equitativa para todos.
Mariolí Archilenger Leite
Advogada e Escritora